A culinária quilombola é um reflexo direto da história de resistência e adaptação das comunidades negras no Brasil. Originárias de territórios conquistados e cultivados por pessoas que fugiram da escravidão, essas comunidades mantêm até hoje práticas alimentares do período colonial.
A relação entre a agricultura familiar e a produção de alimentos nas comunidades quilombolas é uma das principais fontes de subsistência e identidade, sendo profundamente ligada ao cuidado com a terra e ao uso sustentável dos recursos naturais.
Nas comunidades quilombolas, a base alimentar é composta por cultivos que, em sua grande maioria, são de culturas temporárias e permanentes, como mandioca, milho, feijão, macaxeira, caju, acerola, mamão, banana, umbu e coco.
Esses alimentos não só fazem parte do cotidiano dessas populações, mas também são cultivados com práticas que buscam garantir a preservação do território para as futuras gerações. O cuidado com a terra é um princípio fundamental para a permanência dessas comunidades em seus territórios, evitando a degradação ambiental e respeitando os ciclos naturais.
Cultura alimentar
A agricultura familiar, prática essencial para a produção desses alimentos, é realizada de maneira coletiva, com uma forte conexão entre os saberes tradicionais e os processos agrícolas.
"A partir desta cultura alimentar, estruturaram-se modos de fazer o plantio, de colheita e de troca que se tornaram tradicionais dentro da nossa comunidade", explica Andreia Nazareno dos Santos, do Quilombo Sítio Grossos, no Rio Grande do Norte.
Esses modos de produção são passados de geração em geração, assegurando não apenas a manutenção dos produtos alimentares, mas também a preservação de toda uma forma de viver que respeita os ciclos naturais e garante a sustentabilidade local.
Entre os produtos mais típicos da culinária quilombola, estão aqueles derivados da mandioca, como o beiju, o bolo, o grude e a tapioca. Esses alimentos são preparados a partir de técnicas que remontam aos tempos ancestrais e refletem a adaptação dos quilombolas ao seu ambiente. A mandioca, cultivada em diversas variedades, é uma verdadeira base alimentar, utilizada de inúmeras formas e combinada com outros ingredientes para criar pratos saborosos e nutritivos.
Identificação de Origem
Andreia explica que além da mandioca, a produção de frutas como a banana e o caju também é comum nas comunidades quilombolas. Estes produtos são importantes para a alimentação diária e têm um papel significativo no comércio local e na troca entre as comunidades. A agricultura familiar é, portanto, um sistema que vai além da subsistência, ela é uma forma de fortalecimento da economia local e de preservação cultural.
O governo federal reeditou, em 2023, o Selo Quilombos do Brasil - Identificação de Origem. Desde então, já foram emitidos mais de 200 selos em todas as regiões do país. A iniciativa agrega valor à produção quilombola, principalmente com o aumento da procura das pessoas por alimentos que geram sustentabilidade, responsabilidade social e ambiental, valorização da cultura local e da produção regional, geração de renda e desenvolvimento local sustentável.
A relação entre a culinária quilombola e a agricultura familiar, ao mesmo tempo que garante a sobrevivência das comunidades, também é um exemplo de como a agricultura pode ser realizada de forma sustentável. Ao cuidar da terra e garantir a sua saúde, as comunidades quilombolas preservam o alimento e também sua identidade e seu território, de maneira a garantir a continuidade de seus modos de vida.
"Esses saberes e práticas, baseados na troca, no respeito pela terra e na valorização dos produtos locais, são legados dos nossos ancestrais, que ensinaram a cultivar com sabedoria e a respeitar os ciclos da natureza", acrescenta Andreia. A culinária quilombola é mais do que uma forma de se alimentar de uma comunidade, é uma maneira de preservar uma história, uma cultura e uma forma de viver que resiste ao tempo e à modernidade.
Comunidades, agricultores e agricultoras quilombolas que tenham interesse em obter o Selo, devem acessar o site Vitrine da Agricultura Familiar. É necessário que seja feito o registro prévio no Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF), que pode ser buscado junto às secretarias municipais ou estaduais, conforme a localidade.
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