Capoeira é ferramenta de aprendizagem na primeira infância
- Márcio Leal
- 21 de out. de 2024
- 3 min de leitura

"Quem te ensinou a nadar? Foi o marinheiro. Foi o peixinho do mar". No embalo da canção “Peixinhos do Mar”, que a Amora, de 5 anos, ao cantar junto de sua mãe, Micheline Farias, demonstra o que a capoeira significa para ela. Desde 2022, Taiane Vitória, que prefere ser chamada de Amora, pratica capoeira, "porque dá para fazer estrelinha", explica a pequena ao contar sobre seu movimento favorito.
A família mora no bairro Jardim Colégio, no distrito do Capão Redondo, na zona Sul de São Paulo (SP), e as aulas da Amora são no Núcleo de Acolhimento e Valorização da Educação (NAVE), no bairro Jardim Maracá, no mesmo distrito, com o mestre Renato Nato.
"Quando eu chego, me sento ali na roda. O professor manda a gente pôr o tatame e aí a gente faz estrelinha, ponte, bananeira, martelo", conta Amora. Quando o assunto é instrumento, ela diz que o berimbau é o seu favorito e que aprendeu a tocar nas aulas de capoeira. Entre os amigos que fez nas rodas, ela cita o Lorenzo Miguel e a Camila, e diz que para além de brincar, "a gente precisa fazer tudo o que o professor faz primeiro".
O brincar e a ludicidade são os principais elementos que conectam a primeira infância e a capoeira. As possibilidades de desenvolvimento para crianças de até seis anos são muitas. Desenvolvimento motor, cognitivo, psicológico, consciência corporal, percepção de espacialidade, de tempo e de musicalidade são aspectos despertados através do brincar, que junto do aprendizado sobre ancestralidade e a história do povo negro também se conecta com os benefícios que a capoeira angola proporciona para crianças.
Kamila Gomes, integrante do Instituto de Capoeira Angola Alagbedé (ICAA), destaca que o trabalho também é uma estratégia política. "Uma maneira da gente formar pessoas empoderadas dentro do processo de luta antirracista para que eles também façam seus desdobramentos e isso começa na primeira infância".
"Capoeira tem uma série de fundamentos, é tão complexa que até hoje não [se] consegue definir se é luta, dança ou música." A partir dessa multiplicidade de funções, a educadora e cofundadora da coletiva N’Kinpa – Núcleo de Culturas Negras e Periféricas, Joice Teixeira, explica que, quando reconhecida enquanto fundamento histórico, intelectual e filosófico do povo negro, a capoeira tem o potencial de ser uma ferramenta antirracista, inclusive na educação infantil.
Esse potencial da prática é vivenciado no cotidiano, como no caso da Maria Vitória, de 5 anos. "A minha filha é tão pequena e já sofreu racismo de uma coleguinha que falou que ela era uma criança preta, pobre e feia", relata Silvia Cristina, mãe da Maria Vitória. Silvia é analista de relacionamento e junto com a filha moram no bairro Cidade Domitila, localizado no distrito de Jabaquara, zona sul de São Paulo (SP).
Maria Vitória é ativa, se equilibra nos brinquedos do parquinho, corre e pula. No entanto, na hora da conversa ela é concentrada, presta atenção e fala pouco, mas muito sinaliza. Ela conta que gosta de brincar de capoeira e que quando crescer quer ser médica, para cuidar de crianças.
A pequena comenta que outro dia na escola subiu no escorregador e acabou caindo, chorou, mas voltou a brincar. Assim como na capoeira que ensina como cair e levantar, ela já estava desbravando o brinquedo novamente. O relato da vivência da Maria Vitória com a capoeira é o corpo em movimento.
(*) Texto elaborado a partir das matérias "Capoeira angola: prática é apontada como ferramenta de aprendizagem na primeira infância" (13/08/2024) e "Falha na aplicação da lei se torna obstáculo para educação antirracista na primeira infância" (20/08/2024), publicadas no Desenrola e Não Me Enrola. Visite os links e leia as matérias completas!
Comments