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Foto do escritorMárcio Leal

Pessoas trans: Como alterar nome e gênero direto nos cartórios


A possibilidade de alteração do nome e do gênero em documentos oficiais é um direito garantido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2018 a pessoas não cisgênero, que são as que não entendem ter o mesmo gênero que foi atribuído quando nasceram.


Órgãos e entidades do governo, o Judiciário e serviços de saúde e assistência social são obrigados a respeitar as mudanças nos documentos. E não é necessário apresentar autorização judicial, laudo médico ou comprovação de cirurgia de afirmação de gênero para alterar os documentos.


O processo é orientado por uma norma do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabelece regras para tribunais e cartórios de todo o Brasil, que é a Resolução nº 150/2023, nos art. 516 a 523.


1. O que é nome social?


É o nome pelo qual uma pessoa não cisgênero se reconhece e é reconhecida socialmente. A adoção do nome social não envolve alteração dos registros em cartório e ele é utilizado junto com o nome oficial da pessoa.


O Decreto nº 8.727/2016 determina que todos os órgãos e entidades da administração pública federal devem adotar o uso do nome social. O direito se estende a estabelecimentos de saúde vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS) e a centros de assistência social.


No caso de escolas e universidades, a Resolução nº 1/2018 do Ministério da Educação determina que maiores de 18 anos podem solicitar o uso do nome social durante a matrícula ou em qualquer outro momento sem a necessidade de mediação. Já para crianças e adolescentes, é necessário autorização dos pais ou responsáveis legais.


E a Resolução nº 270/2018 do CNJ também garante a adoção em registros do Judiciário, como no quadro de funcionários e nos sistemas e documentos de tribunais.


2. O que pode ser alterado/retificado em cartórios?


Da mesma forma que terapias hormonais ou modificações corporais - também garantidas pelo poder público à população LGBTQIA+ -, a retificação é um direito que depende apenas da escolha individual.


Podem ser alterados:


  • O nome;

  • Os agnomes indicativos de gênero (ex: Júnior, Filho, Neto);

  • O gênero em certidões de nascimento;

  • O gênero em certidões de casamento, desde que haja autorização do cônjuge.


É possível optar pela retificação do nome, do gênero ou de ambos. A adequação não inclui o sobrenome e o nome escolhido não pode ser igual ao de outro membro da família.


3. Como funciona o processo de alteração/retificação?


Qualquer pessoa não cisgênero com mais de 18 anos tem o direito de solicitar a retificação em qualquer cartório de registro civil do território nacional — que, por sua vez, deve encaminhar o processo ao cartório que registrou o nascimento.


No site do CNJ, é possível encontrar o endereço e os contatos de todos os cartórios do país selecionando a opção "localização de registradores civis e unidades interligadas".


Para maiores de 18 anos, não precisa envolver advogados ou advogadas ou Defensoria Pública. A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) possui um modelo de requerimento de alteração no registro que pode ser apresentado. No caso de pessoas com menos de 18 anos, a adequação só pode ser feita por via judicial.


Como forma de preservar a privacidade, o processo é feito sob sigilo e não há menção da retificação nos novos documentos.


Após o fim do processo, o CNJ prevê que os cartórios devem notificar os órgãos responsáveis pela expedição do RG, do CPF, do passaporte e do título eleitoral para adequação desses documentos. Outros, como a carteirinha do SUS, a carteira de habilitação e a carteira de trabalho devem ser alterados pela pessoa que requisitou a correção.


Os valores da retificação do registro e da emissão dos documentos necessários variam de acordo com o estado em que está sendo feito o pedido e são definidos pela Corregedoria-Geral da Justiça de cada estado. O requerente deve entrar em contato com o cartório de sua região para se informar sobre os preços.


Também é possível solicitar a gratuidade em alguns cartórios mediante uma declaração de hipossuficiência — documento em que uma pessoa se diz incapaz de arcar com os custos do processo. Como não há previsão legal para a gratuidade, a declaração pode não ser aceita em todos os cartórios do país. Caso haja negativa, é recomendado que o indivíduo busque auxílio legal.


4. O que é necessário para solicitar a alteração/retificação?


Junto ao requerimento, é necessário apresentar os seguintes documentos ao cartório:


  • Certidão de nascimento atualizada;

  • Cópia do RG;

  • Cópia do CPF;

  • Cópia do título de eleitor;

  • Comprovante de endereço;

  • Cópia da Identidade Civil Nacional (ICN), se tiver;

  • Cópia do passaporte brasileiro, se tiver;

  • Certidão de casamento atualizada, se tiver;

  • Cópia da carteira de identidade social, se tiver.


Além disso, é preciso apresentar algumas certidões, sempre dos locais de residência dos últimos cinco anos:


  • Certidão negativa de ações cíveis (estadual e federal);

  • Certidão negativa de ações criminais (estadual e federal);

  • Certidão de execução criminal (estadual e federal);

  • Certidão dos tabelionatos de protestos;

  • Certidão da Justiça Eleitoral;

  • Certidão da Justiça do Trabalho;

  • Certidão da Justiça Militar, se for o caso.


Não há necessidade de apresentar laudos médicos, parecer psicológico, autorização judicial ou comprovação de cirurgia de afirmação de gênero.


A existência de ações trabalhistas ou criminais, assim como dívidas, não são impedimentos para realização da retificação. Nesses casos, no entanto, a adequação deverá ser comunicada aos tribunais e às pessoas credoras. A notificação poderá ser feita pelo cartório ou pelo requerente, a depender do local do processo. O recomendável é consultar o escrevente do cartório sobre como prosseguir.


5. E se o cartório recusar?


Se não for por falta de documentação, os cartórios de registro civil não podem se recusar a realizar o processo de retificação e também não podem exigir documentos fora da lista definida pelo CNJ.


Em caso de recusa, a pessoa pode fazer uma denúncia aos órgãos responsáveis pela fiscalização das repartições, como a Defensoria Pública, o tribunal de Justiça do estado em que se localiza o cartório e a Corregedoria Nacional de Justiça.


É possível ainda denunciar comportamentos abusivos do cartório por meio de um formulário disponibilizado no site da Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg).


Além disso, organizações como a Antra possuem projetos para monitorar a atuação dos cartórios em procedimentos de retificação e aceitam denúncias, reclamações e dúvidas sobre o processo.

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